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sábado, 28 de julho de 2018

Tocamos as vezes, uns nos outros, em uma parte nossa que é normalmente muito protegida. Essa parte macia e frágil como a carne de um caranguejo por baixo da casca.
Tocamos quando o concreto se desmancha e o tempo deixa de ser uma linha reta
e quando confiamos no mundo como uma criança confia em um adulto.
Andamos assim com nossa vulnerabilidade, esbarrando-se com ternura crua e delicada
e enquanto não houver medo, não vai doer.

sábado, 7 de julho de 2018

lembro da minha gigante coleção de ossos, tirados de todos os lugares
ossos de pássaros, de peixes
e você, querendo imprimir em mim o tipo de lava que existe em você,
- nunca com palavras porque você gostava de manusear as coisas que existem no ar - quebrou-os tanto 
e os vizinhos viram uma farinha de ossos caírem oito andares, sujando uma janela de cada vez.
essas suas ideias sempre causam um tipo de suspensão de alguma coisa
pra mim a farinha ficou suspensa por dias
os pedacinhos maiores lá embaixo, na calçada, pedacinhos de estrutura de corpo
não apenas de um animal mas de vários
e uma coisa dentro de mim suspensa, uma coisa muito sútil como uma fumaça parada no ar
o tempo um pouco parado



. .,      .    . ...

domingo, 1 de julho de 2018

em mim habita uma coisa antiga que quer sair
e ela não se importaria se tivesse que rasgar minha garganta ou peito. eu preferiria que ela fizesse; saísse com violência, sem usar os caminhos usuais do corpo
mas ela é paciente essa coisa
ela assiste minhas tentativas de deixá-la sair pelos olhos e reconhece meu esforço
mesmo eu sabendo que ela é grande demais e nunca seria tão fácil.
em dias de lua cheia é pior
é como se eu fosse sempre um bicho grávido, quase parindo
e a coisa se revira em mim como os bebês se reviram na hora de nascer,
mas ela nunca nasce
(na cidade as vezes penso que vi a lua
mas quando olho direito é um poste ou uma placa do burguer king).
essa coisa antiga é muito sincera e crua. ela deve ser feita de terra e carne e pulsar de um jeito brusco, com uns olhos imensos que olham sempre (esses olhos eu sinto no fundo de tudo).
se eu ficar bem quieta, ouço dentro aqui
ela não fala
tem um som estridente de silêncio e gargalhada
eu queria poder tirar minha pele como quem tira uma fantasia
e deixar a coisa existir.