Web Analytics

domingo, 24 de dezembro de 2017

entre todos os passarinhos que vi essa semana, você é o que eu mais quero bem e o que eu mais quero livre. 
.
os últimos dias foram pra observar o efeito do sol no seu corpo. 
foram pra observar os efeitos da sua boca no meu corpo, do seu sorriso de inundação.
penso no estranho que é eu não conseguir muito bem escrever sobre você, enquanto sobre os outros é quase inevitável. 
dormi essas noites sentindo sua pele e sua respiração (cheiro doce e metálico), e as palavras vinham misturadas em brasa e cinza, nunca organizáveis, nunca colocadas no papel. as vezes acordava no meio da madrugada clareando e podia ver tua barriga, seus seios, tua suavidade, e sentia que ventava dentro em mim um vento gelado; no escuro eu ouvia o mar. 
e quando amanhecia e a primeira coisa do dia eram seus olhinhos de quem parece sempre ter aprontado algo, eu lembro de pensar que não importava o quanto de sol fizesse lá fora, nada poderia iluminar mais o quarto. 
as vezes quase me frustrei, porque apesar disso não te escrevia, não soube. acho que hoje entendi. 
eu não soube porque você não é a fonte, você é a própria poesia.

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

distorce o tempo com olhos de ascendente em signo de terra
pequenininhos, quase pretos, sorrindo toda hora os dois.
parece que ela foi da minha vida antes 
e que é lembrança sendo acesa como lâmpada antiga e quente (alguma que depois de anos ainda funcionasse).
.
sei que estou correndo em direção à uma tempestade na praia. sei da eletricidade, da violência do vento, da iminência do impacto. sei que ela é suavidade, mas é de Iansã
mesmo assim, uso um corpo sem medo e vou
uso um corpo que inunda toda vez que ela sorri.

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

fiquei sem escrever um mês inteiro. querendo produzir beleza, fico no raso de mim.
quis dizer coisas, mas ouvindo minha própria voz senti como falando uma língua antiga e morta. queria ficar sem falar um mês inteiro.
parece que as palavras são como parasitas de pele, expostas, incômodas
e todo mundo pensando que, é óbvio, melhor se não existisse pele.
ando sempre no meio da sentença
permaneço nas vírgulas

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

da necessidade de manter algumas coisas subterrâneas em mim
.
te vejo feliz e defronto meu egoísmo puro, pesado. me pego pensando se alguém te escreve cartas ou faz desenhos seus
porque é difícil não te olhar como nascente de afetações, poesia espessa e dolorida.
te afasto e me afasto desses pensamentos o quanto posso, mas as vezes
raras vezes, juro (agora sim)
lembro da sua pele e me deixo afundar. 

terça-feira, 31 de outubro de 2017

te vejo profunda e quieta, lago abismal antigo 
e nunca saberia dizer se é de água fria ou fervente 
te ouço cantar e é como se eu ouvisse a chuva - nunca-capturável gota que pousa e escorre, deixando um rastro molhado na pele 
que está ali, mas não está
tudo sobre você é líquido.
Pensei uma rua feita de pessoas que não atrapalhassem minha solitude 
sentada no meio fio sozinha sem que ninguém me abordasse
sorrisse pra mim
gritasse do carro
sem que ninguém sequer me olhasse muito.
Pensei ontem desenhando uma coisa besta, escrevendo poeminhas
de mágoa
que nós poderíamos ter sido algo
aí percebi que eu sou algo muito maior do que qualquer possibilidade frustrada 
porque existo.
Um dia me perguntei quando eu deixaria de ser planeta em magma puro, sem uma camada dura, planeta em carne viva
e vi
uma rocha
em mim. 
te via sempre 12:30h, horário fronteira 
parece errado desejar "bom dia", porque o sol vai alto
e sinto que desejar "boa tarde" é precipitar o tempo. 
e aí nunca soube o que desejar.
da mesa onde eu sentava via seu sorriso aparecendo fácil, e não entendia como alguém podia sorrir lá dentro, lugar fechado sem ver a rua ou o céu
hoje entendi o porquê 
na falta de sol, alguma coisa precisava iluminar o lugar. 

sábado, 23 de setembro de 2017

23/09/2017, 20:58, sábado

essa sou eu, com 21 anos. esse é meu corpo de agora. eu tenho tatuagens, cicatrizes e sardas que não tinha ano passado. com 21 anos passei a ter chulé as vezes.
essa sou eu, com 21 anos. sinto meu corpo reclamar se como mal, se fico muito tempo parada ou se bebo demais. lembro dele se recuperar mais rápido antes. eu encontrei uma celulite na bunda e fiquei feliz. 
essa sou eu, com 21 anos. tenho superado algumas dificuldades sociais. tenho medo de intimidade. me apaixonei muitas vezes esse ano e me frustrei e fui enganada e me recuperei e vou me apaixonar de novo. tenho usado muitas drogas.
essa sou eu, com 21 anos. eu amo e estou feliz. eu me aceito hoje. me sinto responsável e tenho pouco tempo livre. aprendi a aplicar massagens e aplico. continuo gastando muito do meu dinheiro em comida, cerveja, incenso e maconha, mas agora também gasto em passagens de ônibus. 
essa sou eu, com 21 anos. eu estou desejando ter uma conversa sincera com os meus pais. dizer que gosto de mulheres, que acho que meu irmão precisa passar menos tempo na internet e que meu pai não pode ser tão rude com minha mãe. dizer que não quero ser rica nem abrir uma empresa, mas que quero viajar. 
essa sou eu, com 21 anos. eu sinto que não estou aproveitando a faculdade. no meu quarto tem pinturas inacabadas que comecei a mais de um ano, as telas cheias de poeira, abandonadas. eu começo a ler sete livros ao mesmo tempo e não termino nenhum. eu falo do meu irmão, mas gasto um tempo inaceitável de navegação aleatória na internet.
essa sou eu, com 21 anos. sou jovem, branca, classe média alta. não entendo nada do mundo adulto. piro muito com alienígenas e acho que eles são mestres espirituais. 
essa sou eu, com 21 anos, num sábado a noite, em casa, propositalmente sozinha, satisfeita, confusa um tanto, meu quarto está sujo, bem sujo, minha roupa sem dobrar, objetos acumulados para os quais não sei um fim apropriado. essa sou eu, hoje, com 21 anos. sinto que estou vagando e tudo bem.

domingo, 17 de setembro de 2017

eu queria parir palavras
que abarcassem um pouco da imensidão que sinto
arranco peles dos lábios quando estou aflita e hoje eles estão sangrando
acordei e permaneci com uma sensação parecida com o que a gente sente ao ouvir uma criança gritar de dor
um susto paralisante e ágil. como se chama?
essa noite tive mil tipos de pesadelos e acordei chorando
chorei acordada também, remoendo os sonhos
e fiquei feliz porque me percebi forte
eu sou uma mulher
forte
e entendo que o sofrimento é só uma frequência baixa na qual também precisamos vibrar 
o todo espera porque não há nenhum lugar a se chegar.
eu não caí. 

domingo, 10 de setembro de 2017

sua boca, sua postura e seu jeito de ler um poema
o leão no seu ascendente 
e como ele sempre me impeliu a te assistir vivendo 
e o quanto foi difícil entender que minha vontade de você dorme numa terra preta 
talvez num canteiro, numa horta 
deitada e fria, como um cadáver.
te imagino lendo isso, e pensando nisso depois caminhando na rua
de cabeça baixa e mãos cruzadas nas costas, olhos que não olham nada.
lembro da minha intimidade com seu corpo, do seu nariz pequeno
e te amo com uma verdade tão profunda quanto a verdade que uso para entrar no mar
te amo limpa 
te amo além de toda minha incapacidade de amar o mundo
destino à ti um amor sobre o qual trabalharei pra destinar à tudo que existe
te amo de gratidão pura
e penso que matéria orgânica que já não vive mais posta sobre terra preta só pode se tornar adubo. 

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

assisto chover na tua casa, telhado de pombos
nas flores da entrada
mas não na sua irreconhecível cama, ela é quase árida 
capto alguns pensamentos boiando na superfície: nós esquecemos da beleza da qual somos feitos 
e eu sinto que contigo eu seria capaz de lembrar - e você também 
mas falamos palavras de mundo, na falta de outras melhores.
seu cheiro ocupa todo o espaço e lembro de pensar que eu poderia fazer uma rachadura na sua carapaça 
nunca pude.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

resolvi ignorar alguns sinais do universo 
e a constatação lógica de que você é problema
porque sinto que tu vale a minha queda
e que vale a pena trocar um pouco de provável-dor-futura pela visão linda que tive
sua
vestindo uma jaqueta sem nada por baixo para ir no banheiro
e aquela outra de você fumando um cigarro na varanda da minha casa onde é proibido cigarros 
e com certeza pela sua voz. 

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

para os contatos que ficaram sempre pela metade

talvez nossas sensibilidades pudessem ter se tocado se você 
aceitasse ou fizesse convites inusitados 
se você as vezes quebrasse regras do convívio social
fosse inconveniente ou um pouco egoísta 
se você se mostrasse vulnerável comigo
não muito
só um pouco bastava. 
se você não fosse sempre tão educada
tão asséptica e inacessível e perfeita e aceita e de cabelo arrumado 
sempre.
eu poderia ter te pedido: vamos virar essas tequilas 
e quem sabe eu conhecesse uma parte menos controlada tua
me mostra você, me fala a versão completa desses seus pensamentos dúbios, me descreva um sonho erótico
decepcione sua família
confessa uma coisa que não seja bonita
você não precisa ser sempre bonita
não consigo acreditar que sua alma use roupa social ou cante ópera
mas vejo-a rindo descalça na areia fria da praia durante uma tempestade tão cinza e violenta quanto uma tempestade pode ser
selvagem e dolorida, linda
eu nunca te vi. 

domingo, 2 de julho de 2017

resumo de mim

corpo de pele nova macia cor de pouco sol
e cabeça toda bagunçada de coisas acumuladas, não resolvidas, vincos antigos 
uma falta de prática na vida
ter se acostumado com os cantos (não de músicas, mas de paredes) 
saudade do mar que se retorce o ano todo
não ter preferidos nem ser a preferida de ninguém
uma identificação excruciante 
vez por mês morrer de dor e sangrar pela vagina (um sangue grosso e vermelho escuro, tão escuro, cor de substância que se criou dentro de alguém) 
só dormir tarde 
escrever coisas que ficarão semiescondidas 
as vezes ser fraca como bolha de sabão, fraca como um homem, frágil, sol de inverno, promessas de adolescência, frágil frágil, filhote de pássaro, medo, fraca
as vezes ser forte como uma onda de maré alta e lua cheia 
saber que o futuro ainda é grande. 

terça-feira, 13 de junho de 2017

dia 13

o ar da tarde foi como o ar de uma redoma limpa 
de céu nublado, alaranjado um pouco - e doce.
na minha cabeça zumbia uma felicidade estranha. uma felicidade que era quase um espaço vazio, preenchido de possibilidades
(todas as coisas tem uma capacidade implacável de surgirem, se modificarem ou pararem de existir). 
uma felicidade morna que era quase uma tristeza
pairava.
percebi que não faço a menor ideia do que estou fazendo
hoje choveu.

sexta-feira, 9 de junho de 2017

as vezes confundo meu corpo com o mundo
não sei se meus braços são quilométricos 
se tenho pernas que andam ou pernas que são todas as partes.
confundo meu tempo, viro o que sempre existiu 
viro o que nem existe ainda - esqueço que um dia eu não era nascida.
minha língua fica doce como se nunca tivesse tocado água do mar
e minha boca inteira vira céu
e tropeço nas pausas, nos tempos marcados do relógio, em memórias alheias 
vejo tudo ao mesmo tempo
sinto o vento sem que esteja ventando e ouço os ruídos dos animais que estão a um continente inteiro de distância 
ouço-os rastejando na grama, correndo, se alimentando, parindo 
lembro do sangue (nunca esqueço o sangue, no fundo de tudo o farejo e o quero) 
os contornos do meu corpo se diluem, me espalho, existo
entendo
deixo que alguma coisa em mim gargalhe 

sexta-feira, 2 de junho de 2017

uma não-sóbria imperfeita libriana sexta feira (noturna, porque o dia foi de terra)
se me achas racional demais, se me achas em qualquer lugar
eu sou onde e meu tempo é esse
não sei colocar ritmo porém acalento
não sei formar opiniões. minha teoria é observar de olhos doloridos de viver o dia
(estou cansada, mas forte. muito forte).
hoje recuso convites de toda ordem, em partes porque tenho um corpo dócil, mas principalmente porque sinto fome e estou tão bêbada ainda do ano passado.
não posso dizer que sinto muito. nem posso dizer que quero pontuar as linhas
revirar os olhos
deslizar em alguém
falar coisa com coisa
falar coisa com coisa não quero
hoje me apaixonei três vezes. vi duas pessoas num palco e me apaixonei por elas. um era bonito de boca morena, uma era desconhecida e tinha vários olhos. a outra foi mais cedo e ela me acertou linda como um soco na cara, mostrando um sorriso quilométrico. já os superei.
hoje tive uma longa conversa importante sentada sozinha num banco de um ônibus que leva as pessoas pra casa ou pra mais longe dela.
tracei meridianos.
vou tomar um banho e o cheiro de cigarros dos outros vai sair. tomar banho é ser eu mesma.

domingo, 28 de maio de 2017

Fazem longas semanas que não nos vemos.
Não sei como está sua barba, não sei como está seu sistema imunológico e não sei se você resolveu seus problemas. Não sei se você está feliz. Eu disse semanas mas parecem anos.
Ontem usei batom escuro mas você não soube. Tem um corte pequeno na minha bochecha que já deve estar curado amanhã, e você nunca saberá, a não ser que eu te conte (não vou). Tenho escrito no papel, e não no computador, quando é sobre você. Acho que quero que pareçam cartas (que serão sempre nunca-enviadas). Foi meu gato quem fez o corte. Meu gato que te fazia espirrar.
Não consigo mais evocar com absoluta clareza a memória do seu cheiro, como eu conseguia alguns dias anos atrás. Isso não quer dizer que eu pense menos em você.
Estou escrevendo isso no lugar onde tudo começou, com a caneta de um estranho que parece impaciente. O céu está bem cinza e me conforta saber que ele te cobre também.
Eu disse cinza, mas é um dia fatalmente azul. (acho que estou usando essa palavra do jeito errado).
-
Hoje reparei que não importa como você se sente sobre mim. Pra ir mais fundo, hoje reparei que você, na verdade, nem existe. O que existe sou eu
minha cabeça
minha criação
e o olho que olha a mira.
Vou agora mesmo mandar uma mensagem dizendo que tenho saudades. Enviada.
Não, não tenho saudades de transar contigo. Não quero tocar sua boca com a minha. Não tenho carência de você; tenho saudades. Não da sua pele mas da sua presença, da sua palavra, das suas piadas.
Tu respondeu - está feliz e tem saudades também. É possível que tenha diminuído 1 cm das centenas de quilômetros e de décadas e de fatos entre nós?
Não importa porque você não existe. Essa pessoa para a qual eu escrevo, de quem eu lembro e em quem eu penso incessantemente não é uma pessoa que existe.
.
.
.
Agora vou escrever sinceramente para o Você De Verdade: Quero tanto que você seja feliz. Tenho saudades de coisas que não aconteceram. Nós nunca nos olhamos de verdade. Eu serei vulnerável sempre que você quiser ou sempre que você não quiser. Eu nunca chorei por você, mas hoje eu vou. Vou chorar, mas não estou triste, estou feliz. Desejo coisas lindas para sua vida, tão lindas como a pessoa linda que você é.
Nunca mais vou escrever pra você, nem para o você que existe e nem para o você que não existe.
Talvez eu te envie isso, provavelmente não. Isso é uma despedida literária. Tchau.

12/05/2017 Isso não é um bilhete, mas uma carta.

Tento me convencer que via vontade de mim no seu nunca-vulnerável rosto.
Mãos minhas ter percorrendo mais que só na pele, como planetas gigantes orbitando você. Orbitando a nunca-vulnerável você.
Me veio uma urgência com a qual você não soube lidar, nem eu, eu comendo sopa antes que ela estivesse na temperatura boa, queimando todo o caminho até as paredes do estômago, sopa sulfúrica:
você.
Te esbarrar cruamente nos corredores e lembrar dos seus orgasmos chatos, rosto não-vulnerável gozando rápido, chato, escondido, fingir que não quero, fingir que nem quis estar na sua vida chata apertada corrida.
Hoje caminhei na rua sem te sentir, ou sem te saber. É lua cheia em escorpião. Deixei os olhos absorvendo a rua, piscando quase nada, e chorei, e as gotas pingaram de mim e furaram o asfalto, marcando o caminho pra que eu não esquecesse como voltar.
Não estou triste. Estou grave, inconsciente, fatalizada e azul
sobretudo azul.
Mas não triste. Adotei por hábito passar 10 segundos por hora desejando que você seja feliz e completa. Eu sou, nada ficou inacabado. A não ser talvez a sombrinha que deixei na sua casa e a não ser com certeza os orgasmos que você nunca me deu. Os meus não seriam chatos e eu não esconderia o rosto.
Resumindo os dias, estou bem.

terça-feira, 23 de maio de 2017

eu não espero a doçura da surpresa. não espero abrir a janela a noite e encontrar a lua cheia, morna, em um signo de ar. não espero chuva em dias secos, pé de amora no caminho, convites pra tomar chá. 
gostaria de não mentir.
tanto faz pra mim quem buzina no meu portão, sem avisar que vinha, trazendo uma novidade e o escorregadio susto dos dias. quem me liga urgente pra falar que viu um cachorro engraçado. quem diz por mensagem "vem aqui, vamos fazer alguma extravagância juntos."
pra mim tanto faz essas pessoas quanto quem qualquer coisa. a falta de curiosidade ou ardência de vida, tanto faz.
eu não quero a doçura da surpresa.
(gostaria de não mentir e estar satisfeita só com o pulso presente - mas estou trabalhando nisso.)

quinta-feira, 13 de abril de 2017

Levo meu tempo contigo como alguém que passeia, sem pressa, num caminho enfeitado com pedrinhas e cheio de coisas pra ver ao redor. Gosto da nossa comunicação feita de pele que raramente precisa do verbo.
Assim que você vai embora, entro imediatamente num estado de espera não-ansiosa, ou saio de um estado de suspensão do tempo - coisa estranha que você provoca.
(Das coisas que você provoca: uma espécie de confusão mental, uma sensação de que não te aproveitei o suficiente, um pequeno medo, um tesão absurdo.) 
Isso não é um bilhete. 

sábado, 8 de abril de 2017

partes minhas e tuas (estou escrevendo isso na sua casa enquanto você viaja)

começou quando nos reconhecemos. ouvi sua voz, senti teu cheiro, rimos juntos e suas raízes começaram a se afundar em mim. começou (e continuou sempre) com você sendo meu amigo.
depois, o desejo monstruoso, a fome da pele alheia. as noites infinitas de vinho e cerveja compartilhados e poemas compartilhados e lençóis compartilhados. meus fluidos por todo seu corpo. tuas marcas de dentes e unhas pelo meu. nós muito bêbados e muito chapados.
veio, depois disso, tudo que vem quando o pedestal desce e a projeção acaba. a clareza do amor sincero. conversas sóbrias. você cuidando de mim, eu te seguindo pela vida dura, você sendo vulnerável um pouco, eu escrevendo muito. nós sentindo ciúmes.
lembro quando veio o ciúmes. o incomodo velado por não ser a unica, eu ficando brava quando você não trocava o lençol. você doendo daquele viajante cearense por quem eu me apaixonei antes, doendo daquela guria libriana por quem eu me apaixonei várias vezes.
mas sempre a compreensão vinha. ainda vem. com a auto análise e os diálogos sinceros. (eu te amo).
aí, um dia, você me deu uma escova de dentes só minha que ficaria na sua casa.
.
criamos uma rotina que envolvia conversas desimportantes, netflix, cozinhar juntos, sexo bem feito, banho compartilhado, e eu quis que você fosse da minha vida sempre.
e quero. sem nada disso ou com tudo igual.
e então, aconteceu de você não ser mais o único, e distancias de virgulas se colocarem nos nossos dias. (e eu ainda te amo de amor bom).
ontem percebi que conheço todas as pintas das suas costas.

quarta-feira, 29 de março de 2017

12/03/2017

hoje você me perguntou como vão ser as coisas
nossas
e eu quis escrever um bilhete pra responder que vão ser assim, da minha parte, com escrita de bilhetes
com carinho na nuca enquanto você dirige
com besteiras adolescentes e talvez algumas vontades reprimidas
com dúvidas porque respeitarei o tempo das coisas, e o tempo das coisas nem sempre é claro
mas com delicadeza e beijos no meio do dia.

terça-feira, 28 de março de 2017

carta ao fascínio por uma estranha

as vezes acontece de pessoas me causarem arrepios com a voz. um tipo que começa no topo da cabeça e corre vértebras abaixo.
não entendo direito o gatilho ou o motivo e nem sei o que essas pessoas tem em comum.
mas ouvir sua voz gravada falando profundezas me fizeram enxurradas de arrepios.
sua voz, que eu nem lembrava como era, mal tinha ouvido antes, o estalo pequeno dos seus dentes entre as palavras, a boca em formato de outro país.
eu aqui e a vida desliza em ritmos curiosos. você lá longe, num lugar que não sei qual é.
e eu não te amo com um amor humano porque não te conheço e não te compreendo, mas te desejo bem.
te desejo força para lidar com a saudade do mar.
queria dizer que quando eu te via pelas ruas do país, achava seu cabelo bonito e achava que você era um bruxa. ainda acho.
força e bem.

segunda-feira, 20 de março de 2017

Tira o casaco, te pedi achando que você obedeceria ao menos isso, ao menos o pedido óbvio de tirar o casaco molhado num dia frio, mas você não acata pedidos nem que sejam de amor. 
Desconfiei que você queria ficar molhada por estar com saudade do mar (o mar está longe e o nosso chão é duro).
Fica?
Você tirou do bolso um dos seus raros sins, e eu não soube o que fazer com a sua presença. Te ofereci todo tipo de coisas, comida, chá, quer que eu acenda um incenso, quer uma toalha, quer tirar o sutiã.
Não te contei, mas essa semana vi um comentário seu no facebook e senti ciúmes, era você falando alguma gracinha sobre casar com alguém.
Desculpa por sentir ciúmes. Eu prometo que vou ser desapegada e tranquila, daqui por diante. Prometo que vou achar graça nos flertes que você dá por aí. Prometo não querer saber sobre as outras pessoas com quem você fica.
Mas posso te pedir pra não casar ainda?
Posso te pedir pra hoje, só hoje, você casar comigo? Finge que nessa noite fria, de roupa molhada, de incenso aceso, nós casamos e precisamos estar em lua de mel agora, aqui na sala. Tira seu casaco, seu sutiã. Tira tudo que você quiser tirar. Não vou te deixar sentir frio. Te falo umas putarias, te mordo a boca fina, posso lamber cada canto da sua pele. 
E você negou porque não acata pedidos, nem que sejam de amor.

quinta-feira, 16 de março de 2017

um dia de lua em escorpião é fundo como um lago antigo.
a cabeça enche de água,
as poucas palavras que chegam na boca são náufragas e sinto vontade de me comunicar com beijos. 
as vezes faço isso. 
se eu tiver o que chorar, choro, pra deixar a água correr.
vejo o prateado de um peixe na superfície de mim. ele mergulha e me pergunto quanto espaço tenho em profundidade. 
(não quero resposta nenhuma). 

segunda-feira, 13 de março de 2017

Essa semana quase morremos. Um caminhão furou o sinal vermelho e foi por tão pouco.
Tremi até a tarde.
Não me sinto capaz de morrer mas não sei o porquê.
Ou porque medo instintivo da morte ou porque a vida é boa.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

é difícil se equilibrar na latência do mundo.
nas coisas que quase acontecem o tempo todo. nas nuvens pretas que cobrem a cidade e não derramam. no momento antes de espirrar. na preparação do salto. no susto.
as vezes, no meio do dia, lembro de sentir aquele ponto nevrálgico da existência; a vida só acontece agora.
agora.
nem um segundo além desse segundo.
ando alguns momentos com essa consciência: sinto o chão acolher meus passos, agora, o ar deslizar para dentro de mim espontâneo, os líquidos que me preenchem, agora, o que meus ouvidos processam, muito nesse agora, as dores do meu corpo de agora.
existo agora delicada e forte.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Não te conheço.
Não te conheço e mesmo assim, te uso como material pra poesia. 
Imagino conversas nossas no chuveiro e as vezes acho que sinto seu cheiro quando dobro alguma esquina.
Não te conheço e não te amo (não te amo mais do que amo todas as coisas).
Não te conheço, te projeto, e espero que você perceba meu corpo aberto quando envio sinais telepáticos sutis. 
Quero mastigar sua pele
te tocar de todas as formas. 
Você não me conhece mas eu me pinto interessante - não sei não jogar
Chamo sua atenção e finjo que foi sem querer. Toco minha boca quando sei que você está olhando (me sinto estúpida)
funciona.
Não te conheço e nem quero, pra não estragar a fantasia que te criei. 

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

maria caminhou sozinha muito longe, como se quisesse se livrar das próprias pernas. 
no caminho, do lado de fora de maria, acontecia o trânsito da cidade, um por de sol poluído e bonito, barulho de ônibus cheio.
e dentro de maria corria muita água. dentro dela frutas apodreciam e abelhas voavam bem livres.
alguns pensamentos deixavam maria irritada, porque ficamos irritados com a incapacidade de compreender como as coisas realmente funcionam. sem querer ela perguntou em voz alta: será que na maior parte do tempo estamos fingindo, jogando um jogo sem entender as regras, bagunçando o tabuleiro, dizendo que estamos ganhando? 
uma velha mais ou menos ouviu e mais ou menos pensou sobre isso, mas quando quis olhar maria, ela já tinha caminhado mais um monte.
será que o prêmio é, afinal, a vida pura?
quis que sua cabeça funcionasse igual quando estamos quase dormindo, e entendemos tudo. na noite passada, antes de dormir, maria entendeu que é necessário contemplar a vida e aceitá-la como ela se apresenta, já que não temos outra coisa. 
viu um céu carregado de água de verão e lembrou da roupa no varal. 

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Sinto a vida como a tecitura dos anos que vão ficando ao longo do passado.
Sinto a vida ao abrir a janela e saber que abri um dos olhos da noite.
E amo a vida com a mesma força que a odeio, com bolas de choro na garganta.
Amo a falta de novidade nas estações que se repetem como palavras que se repetem. Como a cor da minha pele em janeiro.
Amo o verde brilhante denso comestível das florestas como odeio o sofrimento do mundo. E minhas células tem paciência de alma.
As vezes não me preocupo - sinto sem saber que estamos todos destinados à plenitude contente do vazio.
E as vezes me preocupo tanto que desmorono de estrutura enfraquecida.
Vivo com a delicadeza que uso para segurar bebês no colo, vivo as vezes em tons pastéis, vivo as vezes bebendo vinho, vivo consciente da morte.
Sobretudo vivo muito.