Web Analytics

terça-feira, 7 de junho de 2011

                               eu sei que existem milhões de combinações de palavras pra descrever o que aconteceu aquela tarde, mas não me sinto capaz de encontrar nenhuma.

Era de tarde, quase escuro. Chovia desde manhã; e eu estava lá, parada, na porta de um teatro, esperando nem lembro o quê, no meio de um monte de vento e chuva e gente correndo. Fria, molhada, brava, de lábios sem cor que tremiam.
Algumas pessoas passaram, sem muita expressão, igual elas sempre são mesmo. Muitos nem olhavam pra mim. Eu pensava que dentro dos seus guarda chuvas e bem mais pra dentro das muitas roupas existiam milhões de histórias, medos, coisas pra fazer, viagens, cores, homens e mulheres inteiros que, pelo menos a grande maioria, eu nunca ia conhecer. Posso ter cruzado com um ou outro mais tarde, num dia de sol quem sabe. De qualquer maneira eu seria irreconhecível pra eles sem o cabelo no rosto e os lábios tremendo.
Depois de vários minutos exposta à uma potencial hipotermia e esperando o tal não-sei-o-quê, uma moça de cachinhos vermelhos molhados e com um nariz de palhaço saiu correndo do teatro, olhou pra mim meio de relance, e
sorriu.
Não que nunca tivessem sorrido pra mim.
Mas a maioria esmagadora das pessoas não ri pra uma menina molhada e mal humorada assim, sem esperar nada. A moça não riu pra uma máquina fotográfica, não riu pra dar oi pra algum conhecido, não riu pra ser simpática. Ela riu simples e puramente porque ela teve vontade de rir, porque ela tinha um nariz de palhaço e talvez por achar graça uma pessoinha lá, parada, nervosa, meio xingando sozinha a demora do não-sei-o-quê. Foi o primeiro e talvez o único sorriso sincero que já me deram. Parei de xingar. Sorri de volta. Quis um nariz de palhaço.
Quem eu estava esperando por longos minutos molhados chegou preparado pra uma crise histérica universal. Entrei devagar no carro e sentei sem bater a porta.
-Desculpa, desculpa, desculpa! Não queria demorar assim, juro, você tá ai toda branca de frio ó. Quer ir lá em casa pra se secar? Quer que eu ligue o ar quente? Quer me responder, caralho?
-Tô com frio.
-Eu sei.
-Sorriram pra mim.