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domingo, 24 de abril de 2011

i'm not like u but i still can pretend.

Quem passa perto de mim na rua e me vê maquiada nem desconfia. Quem fala comigo e escuta minha risada aposto que nem desconfia, os vendedores nas lojas não desconfiam, porque sei deixar meu "obrigada" automático bem como o de todo mundo. Alguns animais me olham e temo por segundos, porque animais bem que podiam me descobrir se estivessem procurando por mim. Mas não descobrem.
As vezes tenho medo que meu modo de andar ou de piscar me entregue, e alguém grite e aponte "É uma impostora! Ela é uma impostora!" mas não acho que isso vá acontecer. Manipulei meu cheiro e o som dos meus passos, bem como o de todo mundo. Nem desconfiam.
Existe uma crosta fina de normalidade em determinados humanos e as vezes, o que tem no interior vaza por pequenas rachaduras. Tomamos cuidado, mas um impostor reconhece o outro. Reconhece pela voz, pelos fios de cabelo.
Mas deixa ser então, que nos compreendemos. Nos compreendemos e sabemos fingir.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Tem uma coisa pendente

Os Souza eram uma família perfeita. Ricos, mas decidiram viver de um jeito simples. O pai Roberto trabalhava de blazer esporte, chegava em casa às 4, ficava com os filhos, fazia academia aos domingos. A dona Ana era linda. Usava pouca maquiagem, passeava com a empregada, fazia o melhor bolo de cenoura do mundo e ocupava o cargo mais alto da empresa. As duas meninas já tinham sido chamadas pra trabalharem como modelos algumas vezes, Júlia passava a adolescência querendo ser bióloga e tocava teclado, Amanda cursava fisioterapia e era voluntária em um asilo. Felipe era o bebê mais inteligente e com os maiores olhos castanhos que eu já vi. Um dia Amanda acordou e se jogou da janela do décimo segundo andar.
A despedida foi deixada em batom vermelho no vidro, "Não acho que o mundo seja um bom lugar pra se viver, tampouco que eu seja digna de viver nele." e uma marca de beijo carimbada por lábios finos.
Amanda era infeliz? Tanto quanto eu e você e todo o resto das pessoas. Muito.
Seu erro foi ter cometido a infelicidade de perceber isso.
Felipe cresceu sem jamais ter ouvido falar na irmã, e em poucos anos, a família Souza voltou para a mais total felicidade bege de família perfeita. Com o tempo todos morreram de velhice.
Não, com o tempo todos apodreceram por serem felizes demais. Só Amanda teve a dignidade de brotar, calma, da janela do décimo segundo andar. E sorrindo.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Para a minha bailarina de porcelana

São 16:00h. Estou no banheiro chorando
de saudade
de alguém que ainda vai estar perto de mim por no mínimo mais 15 anos.
Ela está lá fora e eu escuto a risadinha fina que ela acabou de aprender, e o barulhinho leve do sapatinho vermelho batendo e dançando no assoalho.
Ela está fazendo três anos e eu fico me perguntando se todo aniversário dela eu vou chorar desse jeito, como se ela já estivesse saindo de casa.
É uma gentinha pequena de porcelana correndo e rindo vestida de bailarina com sapatos vermelhos, que quase parece pessoa de verdade, e que um dia vai crescer e sair de casa.
Não cresça, bebê. Seja bailarina pra sempre.
Feliz aniversário.